Logo à noite, pelas 22.00h, recorda-se Ary dos Santos, pelas vozes de Mafalda Arnauth, Susana Félix, Viviane e Luanda Cozetti.
Só poderei falar de Ary dos Santos pela memória de outros e pela memória material que está encerrada na obra literária.
No entanto, quero deixar uns apontamentos, que penso serem de justiça fazê-lo:
Primeiro: Para quem pensa que em Ary dos Santos há uma conotação política, engana-se. Há muita mais vida para além da política em Ary dos Santos
Segundo: enaltecer, louvar e até agradecer o empenho e a dedicação destas quatro artistas no refazer a memória de um grande poeta português.
Terceiro: percebo bem que exista ainda pessoas que não gostem de Ary dos Santos. Porquê? Porque em Ary dos Santos a verdade é dura, nua e fria. E numa sociedade que não está sequer voltada para pensar em si própria, é natural que poetas como Ary dos Santos sejam esquecidos (para não dizer banidos). É necessário trazer à tona, mexer e remexer numa sociedade que cada vez mais está alienada e adormecida (ou fizeram-na, à força, adormecer).
E nada melhor que Ary dos Santos para acordar...
Deste modo quero deixar a título de homenagem um dos seus poemas que poderão ouvir no album "Rua da Saudade" e hoje no Coliseu dos Recreios de Lisboa. Aqui fica:
Rock-Chock
São os meninos travolta de um tempo que volta, revolta e vem chatear
São os jeitosos dos truques, parentes dos duques e bichosas de rabiar
São os queridinhos drunfados, drogados, ganzados que andam no gamanço
E põem a cruz gamada depois da palmada a um velho tanso
Eu que até gosto do rock
Só não quero é que me lixem a vida
Pois nunca ando a reboque
Da sociedade que foi mal parida
Eu não quero cacetete, quero o Elvis e o Harley, mas sem capacete
São os meninos ricaços, tarados, madraços, heróis da porta do liceu
O Babazinho e o Dudu que levam na bolsa os livros do Fumanju
São os meninos bonitos que gostam de amigas, de charro e de fitas
Mas que enganam raparigas com duas cantigas e lhes fazem figas
Eu que até gosto do rock
Só não quero é que me lixem a vida
Pois nunca ando a reboque
Da sociedade que foi mal parida
Eu não quero cacetete, quero o Elvis e o Harley, mas sem capacete
São sempre os filhos da mãe, que a culpa é de quem os fez
São no fundo uns desgraçados que andam calçados mas não têm pés
Eu que até gosto do rock
Só não quero é que me lixem a vida
Pois nunca ando a reboque
Da sociedade que foi mal parida
Eu não quero cacetete, quero o Elvis e o Harley, mas sem capacete
José Carlos Ary dos Santos, in album " Rua da Saudade"