quinta-feira, 17 de março de 2011

Geração Desenrascada (um pedido de esclarecimento)

Parvos são aqueles que não respeitam o nosso esforço, que não respeitam a nossa qualidade. Parvos são todos aqueles que não respeitam os nossos canudos.
A manifestação agendada para o dia 12 de Março deixou-me expectante (por saber como se vai desenrolar e se fará os seus participantes tomar mais atitudes que nos ajudem a melhorar o país) e orgulhosa (por ter resultado de um acto espontâneo, de cidadania). Faço parte da «geração à rasca», que já foi denominada como «rasca», mas que com este gesto revelou que se em parte não o conseguiu até agora está, pelo menos nos seus planos, desenrascar-se.

Não se trata de uma manifestação política, nem obrigatoriamente contra todos os políticos (embora tenha a triste sensação que uns e outros se aproveitarão da situação), mas de uma manifestação que pretende mostrar que a «geração rasca» de há dez/quinze anos, provou que as más-línguas estavam erradas e deu origem à geração mais qualificada de sempre. Uma geração que não consegue crescer por inúmeros factores, uns da sua responsabilidade obviamente, outros alheios a si, e nem todos justificados pela crise. Uma geração que, pelo menos agora, resolveu fazer uso da sua formação e utilizar uma ferramenta cívica que pode não mudar o mundo, mas que serve para mostrar que não somos os únicos «parvos» na situação actual. Numa reportagem ouvi um dos jovens dizer «parvos são vocês que não nos aproveitam». Subscrevo totalmente e neste caso esta expressão nem sequer é um insulto. Trata-se apenas da constatação de um facto.

Temos jovens preparados, com experiência a menos para uns empregos e com qualificações a mais para outros, jovens preparados que não conseguem contratos, que têm baixos salários. Jovens preparados com vontade de trabalhar, de crescer, de se tornar independentes e que, por isso, muitas vezes acabam por ter de aceitar trabalhos em condições que não correspondem à sua formação e à sua preparação. Jovens que, trabalhando honestamente, em condições precárias, com baixos salários, num esforço claro para conquistarem a sua vida, ouvem muitas vezes uma expressão desdenhosa que mata e magoa de «tantos anos a estudar e não conseguiste melhor? Tens o canudo para ficar debaixo do braço!»Nem só de canudos vive o homem, é verdade, não é por sermos «doutores» que somos melhores que ninguém, mas também não temos culpa de ter estudado, de nos termos qualificado e com toda a certeza não o conseguimos por sermos parvos.

Felizmente não estou «à rasca» mas conto estar presente na manifestação, em apoio à minha geração (e mesmo correndo o risco de que «degenere» por aproveitamento político), porque os parvos não somos nós. Parvos são aqueles que não nos dão valor, aqueles que não respeitam as nossas horas de sono perdidas a estudar, as tabletes de chocolate comidas para vencer o cansaço, as pilhas de nervos nos exames, nas apresentações, e os quilómetros de conhecimento que pusemos cá dentro. Parvos são aqueles que não respeitam o nosso esforço, que não respeitam a nossa qualidade. Parvos são todos aqueles que não respeitam os nossos canudos.

P.S. – Apercebi-me nos últimos dias que foram marcadas várias manifestações na mesma data e a mesma zona da manifestação da «geração à rasca». Quero deixar aqui claro que, mantendo a minha opinião sobre a manifestação da «geração à rasca», não tomarei parte em nenhuma manifestação para a demissão do governo, da classe política e afins. Uma vez que a situação não fica clara, com estas colagens de várias manifestações, não me encontrarei junto dos membros da minha geração. A minha concordância é com um movimento espontâneo, cívico, de jovens adultos, que pretendem passar a mensagem de que estão qualificados e preparados para ajudar o país e que esperam que o país se prepare para os tratar como válidos. Não me revejo, em absoluto, em qualquer manifestação cujos objectivos não me parecem claros nem merecedores de credibilidade, muito pelo contrário, parecem-me perigosos.

Rita Bruno, in "Família Cristã", 04/03/2011