A vida activa é a inocência das
boas obras; a vida contemplativa é a aspiração dos bens superiores. A
vida activa é para muita gente; a contemplativa é para poucos. A vida
activa é o bom uso dos bens terrenos; a contemplativa é a alegria de
viver só para Deus.
A vida activa é dar pão aos famintos, ensinar ao
próximo a palavra da sabedoria, corrigir os que erram, chamar os
soberbos ao caminho da humildade, reconduzir os desavindos à concórdia,
visitar os enfermos, sepultar os mortos, libertar os presos e os
cativos, socorrer a todos os que precisam de ajuda, prover cada qual do
que lhe é necessário.
A vida contemplativa é consagrar-se de todo o
coração à caridade para com Deus e para com o próximo, recolher-se da
actividade exterior para se entregar exclusivamente às alegrias do
Criador, de tal modo que, prescindindo de todos os cuidados do mundo, o
espírito nada mais procure senão inflamar-se no desejo de ver a face de
Deus; na vida contemplativa, aprende a alma a suportar com paciência o
peso da carne corruptível e deseja ardentemente tomar parte no cântico
dos coros angélicos, ansiando por entrar na convivência dos cidadãos do
Céu e gozar da eterna imortalidade na presença de Deus.
A vida activa
serve a Deus nos trabalhos deste mundo: acolhe os pobres e veste-os;
dá-lhes comida e bebida; visita-os e consola-os; dá-lhes sepultura e
pratica todas as outras obras de misericórdia.
Há duas espécies de
contemplativos: uns vivem vida comunitária nos mosteiros; outros levam
vida eremítica, isolados de toda a gente.
Mas é mais feliz e perfeita
a vida contemplativa do que a vida activa. Assim como a águia, fixando
os olhos nos raios do sol, não se volta senão para buscar alimento para o
seu corpo, assim os santos se voltam, de vez em quando, da vida
contemplativa à vida activa, considerando que, embora aquela seja mais
sublime e benéfica, precisam no entanto, em certa medida, destes bens
inferiores.
Os homens santos saem, de quando em quando, da intimidade
da contemplação para a vida activa; mas voltam novamente, para louvar a
Deus no recolhimento do espírito, onde recebem a força interior que
lhes permite trabalhar cá fora para a glória do Senhor.
E assim como é
da vontade de Deus que os contemplativos se voltem, algumas vezes, da
vida contemplativa à vida activa para utilidade do próximo, também é da
vontade de Deus que, outras vezes, ninguém os inquiete, para que possam
repousar na intimidade suavíssima da contemplação.
(125-128: PL 184, 1276-1278) (Sec. XII)
in Liturgia das Horas