Considera a sabedoria de Paulo. Que diz ele? Penso que os sofrimentos do
tempo presente não têm comparação com a glória que se há-de manifestar
em nós. Então, diz ele, porque me falais dos tormentos, dos altares, dos
algozes, dos suplícios, da fome, do exílio, das privações, das cadeias e
das algemas? Embora apresenteis todas as coisas que atormentam os
homens, nada podeis mencionar que seja digno daquele prémio, daquela
coroa, daquela recompensa. Porque as provações acabam-se com a vida
presente, ao passo que a recompensa é imortal, permanece para sempre.
A
isto mesmo aludia o Apóstolo noutro lugar: As leves e passageiras
tribulações do momento presente. Ele diminui a qualidade com a
quantidade e alivia a dureza com a brevidade do tempo. Como as
tribulações que então sofriam eram por sua natureza penosas e duras,
Paulo serve-se da sua brevidade para diminuir a sua dureza, dizendo: As
leves e passageiras tribulações do momento presente preparam-nos, para
além de toda e qualquer medida, o peso eterno de uma sublime e
incomparável glória. Não olhamos para as coisas visíveis, mas para as
invisíveis; as coisas visíveis são passageiras, ao passo que as
invisíveis são eternas.
Vede como é grande a glória que acompanha a
tribulação! Vós próprios sois testemunhas do que dizemos. Ainda antes
que os mártires tenham recebido as suas recompensas, os seus prémios, as
suas coroas, enquanto se vão ainda transformando em pó e cinza, já nós
acorremos com entusiasmo para os honrar, convocamos uma assembleia
espiritual, proclamamos o seu triunfo, exaltamos o sangue que
derramaram, os tormentos, os golpes, as aflições e as angústias que
sofreram; e, deste modo, as próprias tribulações são para eles uma fonte
de glória, ainda antes da recompensa final.
Depois de termos
reflectido nestas verdades, irmãos caríssimos, suportemos generosamente
todas as adversidades que sobrevierem. Se Deus as permite, é porque são
para nossa utilidade. Longe de desesperarmos ou perdermos a coragem ante
a dureza dos sofrimentos, resistamos com fortaleza e dêmos graças a
Deus pelos benefícios que nos concedeu, a fim de que, depois de gozarmos
dos seus dons na vida presente, alcancemos os bens da vida futura, pela
graça, misericórdia e bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo, ao qual,
com o Pai e o Espírito Santo, pertence a glória e o poder, agora e para
sempre e por todos os séculos. Amen.
(Hom. Sobre a glória nas tribulações 2.4: PG 51, 158-159.162.164) (Sec. IV)
in Liturgia das Horas