O início de Dezembro,
é marcado por trazer à memória da nobre nação portuguesa dois dias de grande
relevo para a história deste Povo-Nação. O primeiro dia de Dezembro recorda-nos
a Restauração da Independência, em 1640, e a chegada ao trono de D. João IV, depois
de 60 anos de domínio da coroa espanhola.
Associado
ao dia 01 de Dezembro e a todo o movimento da Restauração está o dia 08 de
Dezembro, momento em que não só recordamos a coroação de Nossa Senhora, sob o
título da Imaculada Conceição, pelo então rei de Portugal, D. João IV, como
também meditamos o dogma da Imaculada Conceição de Maria definido pelo papa Pio
IX, em 1854.
Desde
os primeiros tempos da nacionalidade que os governantes portugueses têm
dispensado grande atenção ao culto da Virgem Santa Maria. Atenção essa que
vincula não só uma identidade cultural, mas também uma espiritualidade de um
Povo, manifestada ao longo dos anos.
A
justificação, para este facto, poderá ter diversas interpretações à luz da
História. O certo é que, o gesto da coroação de Nossa Senhora da Conceição, por
D. João IV, na conjuntura político-social da época, é interpretado, pela
ciência histórica, não só como uma expressão de Fé, como também, a busca pela
legitimidade do poder quer junto do Povo português, quer perante a comunidade
internacional, a começar pela Santa Sé. A este propósito diz-nos António H. de
Oliveira Marques, que a Santa Sé recusou-se terminantemente a reconhecer a
secessão de Portugal.[1] Na
verdade, em Portugal, o clero estava dividido. Curas locais e monges humildes
parece terem apoiado o duque de Bragança. Dentro das altas hierarquias já o
panorama se apresentava muito diferente. Os bispos estavam irremediavelmente
divididos quanto às suas tendências políticas.[2]
D. João IV, como novo
monarca português não gozava por certo de uma posição invejável. Todo o seu
reinado (1640-56) foi uma sucessão de desaires na diplomacia europeia e uma
situação pouco próspera na economia interna, só compensados por meia dúzia de
triunfos militares em Portugal que impediram uma invasão espanhola em larga
escala.[3] Na
verdade é errado, pensar-se que o período restauracionista português é um tempo
pacifico. Em bom rigor, a este respeito António H. de Oliveira Marques
revela-nos que em Junho de 1641 foi descoberta uma conspiração contra o rei, onde
participavam algumas das melhores famílias da aristocracia. Também intervieram
na conspiração membros da burguesia, da alta burocracia e do alto clero.
Registaram-se outras conspirações; menos ameaçadoras talvez, mas ainda assim
reveladoras de certo descontentamento contra o regime.[4] Para
além disto a guerra da Restauração mobilizou todos os esforços que Portugal
podia depender.[5]
Como podemos
perceber, Portugal era um país que vivia um clima de alguma instabilidade, em
que o “novo-Rei” teria de ser o garante da estabilidade, o restabelecimento da
independência e o factor emergente para a consolidação de um novo regime na
Nação agora restaurada.
Na verdade, embora a
Coroação de Nossa Senhora da Conceição, como padroeira e rainha de Portugal, em
25 de Março de 1646, em Lisboa, fosse por parte do poder uma procura para
confirmar e dar-lhe legitimidade, importa ressalvar que existe aqui uma expressão
de Fé, por parte do Rei e da parte do próprio Povo. Por isso o Rei procura que “todas as cidades, vilas e lugares de seus
reinos tomassem por Padroeira a Virgem Nossa Senhora da Conceição”.[6]
Assim, em 1646, a
Universidade de Coimbra, jura a fidelidade ao dogma da Imaculada Conceição, bem
como em 1654, a pedido de El-Rei, as Câmaras de todas as cidades portuguesas mandaram
afixar nas portas das respectivas muralhas, lápides alusivas à consagração de
Portugal a Nossa Senhora.[7]
A confirmação da
eleição de Nossa Senhora da Conceição como Padroeira de Portugal, surge de
Roma, pelo breve Eximia dilectissimi, de 08 de Maio de 1671.
De tal modo a
Imaculada Conceição caracteriza a espiritualidade dos portugueses, que durante
séculos o dia 08 de Dezembro foi celebrado como "Dia da Mãe" e João
Paulo II incluiu no seu inesquecível roteiro da Visita Pastoral de 1982 dois
Santuários que unem o Norte e o Sul de Portugal: Vila Viçosa no Alentejo e o
Sameiro no Minho. O dia 08 de Dezembro transcende o "Dia Santo" dos
Católicos e engloba indubitavelmente a comemoração da Independência de
Portugal, que o dia 01 de Dezembro retoma. O feriado do dia 08 de dezembro é
religioso, mas é também celebrativo da cultura, da tradição e da
espiritualidade da alma e da identidade do povo português.[8]
josé miguel martins serrão
[1] MARQUES, A. H. de Oliveira,
“História de Portugal: Do Renascimento às Revoluções Liberais”, vol. II,
Editorial Presença, Lisboa 1998, pág. 188
[2] MARQUES, A. H. de Oliveira,
“História de Portugal: Do Renascimento às Revoluções Liberais”, vol. II,
Editorial Presença, Lisboa 1998, pág. 185 e 186
[3] MARQUES, A. H. de Oliveira,
“História de Portugal: Do Renascimento às Revoluções Liberais”, vol. II, Editorial
Presença, Lisboa 1998, pág. 186
[4] MARQUES, A. H. de Oliveira,
“História de Portugal: Do Renascimento às Revoluções Liberais”, vol. II,
Editorial Presença, Lisboa 1998, pág. 188
[5] MARQUES, A. H. de Oliveira,
“História de Portugal: Do Renascimento às Revoluções Liberais”, vol. II,
Editorial Presença, Lisboa 1998, pág. 189
[6] VASCONCELOS, António Garcia
Ribeiro de, “O Mysterio da Immaculada Conceição e a Universidade de Coimbra”,
Coimbra 1904, pág. 92, in Simão Pedro Aguiã, “A Virgem Maria: Padroeira e Rainha
de Portugal e de todos os povos de língua portuguesa”, Civilização Editora,
Porto 1996, pág. 115
[7] AGUIÃ, Simão Pedro, “A Virgem
Maria: Padroeira e Rainha de Portugal e de todos os povos de língua
portuguesa”, Civilização Editora, Porto 1996, pág. 119.
[8] COUTO, Francisco e COELHO,
Francisco Senra, “Fé e Cultura: A Imaculada Conceição e a História de
Portugal”, in http://www.snpcultura.org/imaculada_conceicao_e_historia_portugal.html, 12/09/2012